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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Qual é a tua história?


Há alguns dias venho pensando num comentário comumente feito por fotógrafos mais experientes: “a fotografia está banal”, ou, “muita foto e pouca qualidade”, ou, “cuidado com a fotografia de metralhadora”. Na verdade foi em agosto deste ano que ouvi este comentário pela primeira vez, dito pelo fotógrafo cearense José Albano na abertura da exposição e lançamento do livro “40 Anos de Fotografia”: “tem se fotografado demais hoje em dia”.
Eu, como iniciante na fotografia embebido pelo clima de uma obra de mais de 40 anos, confesso não ter estado atento a todas as palavras de seu discurso. Das que escutei, como essa pequena citação, algumas vem fazendo mais sentido com o tempo, após ter me aprofundado mais no universo da fotografia.
O assunto ainda borbulha em minha mente e certamente o texto não vai dizer tudo que quero. Tentarei ao máximo manter a coerência mas o que quero mesmo é dizer.
Existem alguns motivos para o crescente número de cliques que sempre me foram óbvios, e acho que a qualquer um, como:-com a fotografia digital fazemos quantas fotos desejarmos, escolhemos as melhores para guardar no computador e as perfeitas para imprimir (revelar virou imprimir né) sem aquela ansiedade para saber se a foto ficou boa ou se o filme queimou;-com a fotografia digital podemos fazer fotos de banalidades só pra ver como é que fica e ir treinando o olho sem gastar nenhum tostão (depois é só apagar).
Por aí vai e vocês podem ainda imaginar outros motivos, mas o que realmente me fez refletir sobre aquela citação foi o valor sentimental de cada foto. Quanto mais idade tiver o leitor deste texto mais fácil irá compreender a sensação justamente por ter vivido esta fase histórica da fotografia. É lógico que não estou falando aqui de fotografia profissional mas sim das fotos pessoais, do álbum de família. Quantas fotos você tem do seu primeiro ano de vida? Quantas seus pais tem do deles? Quantas fotos seus filhos tem do deles?
Ao final de outubro deste ano estava fazendo fotos de uma linda garota de 15 anos, no sítio de sua avó, para serem usadas na decoração da festa de aniversário. Ela posou com várias fantasias, todas feitas por sua avó que, durante a sessão, veio mostrar-me um retrato, registrado há mais de uma década, de uma outra neta usando uma fantasia também feita por ela. Era uma comum foto de família, 10X15, feita na sala com a parede ao fundo.
Uma diferença se apresentou de imediato. A praticidade para mostrar aquela foto não se compara a ter que levar a pessoa até o PC ou à TV ou levar o notebook até a pessoa. É lógico que com estes recursos podemos mostrar muito mais fotos. E as pessoas podem conversar e dormir muito mais enquanto veem.
Outra diferença, justamente o motivo deste texto, é a história da foto. E que história aquela pequena foto possuía! Que poder de reativar uma lembrança guardada há tanto tempo. E eu estou falando de dez anos! Pense nas histórias das fotos dos seus avós de 90 anos que já esquecem das coisas do dia-a-dia mas lembram de detalhes precisos ao descrever aquelas imagens. Lembre das fotos que você fazia de um aniversário inteiro com filme de 12 poses guardando cada pose apenas para os momentos especiais (36?! Não, muito caro!). Lembre dos momentos preciosos com pessoas queridas, sentados no sofá, contando aquelas histórias. Cada foto era um tesouro de família guardado a sete chaves.
Quantas das suas fotos hoje em dia tem histórias pra contar? O valor está diluído. Embora o número de fotografias aumente não é um multiplicador, mas sim um divisor do valor sentimental da lembrança. Muitas devem contar apenas um “Olha! Eu e o fulano!” Onde? Não sei! Não me lembro! Quantas são apenas protótipos de você tentando parecer um(a) modelo? Ou pior, quantas são fotos de “bracinho” só com sua cara aparecendo? Ou de frente para um espelho no banheiro? Você está pensando em fazer um trabalho daqui a 50 anos mostrando o quanto seu rosto mudou neste período? Se sim, desculpe, tudo bem!
É indiscutível que há situações em que poder fotografar muito é ótimo. Casais com filhos recém nascidos vão às nuvens ao poder registrar cada expressão diferente de seu bebê. Mas para contar histórias será que sobra pelos menos uma de cada cem?
Confesso! Eu fotografo muuuuito! Não cheguei a experimentar equipamentos profissionais analógicos mas ter uma daquelas yashica de filme nas mãos já me exercia fascínio. Quando fiz uma viagem com dois rolos de filme de 36 poses para usar como quisesse foi o clímax. Depois que comprei minha primeira digital compacta decente me gabei por ter feito mais de quinhentas fotos numa só ocasião. De lá para cá se passaram três anos e eu ainda fotografo muuito! Mas tenho pensado cada vez mais em cada foto que faço. Comecei observando o enquadramento, cuidando para não cortar acidentalmente partes do corpo como pés e cabeças, lidando com a contraluz. Chegando ao campo profissional, em que a câmera não faz tudo por você, começo a brincar com luz, ângulos, foco, profundidade, movimento. O fato é que quanto melhor me saio fotografando, menos fotos eu faço.
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Como disse, o assunto borbulha, o texto cresce, mas para por aqui. Tá ficando pesado e já deu pra cutucar. Provavelmente voltarei a escrever sobre o tema. Vou ali resgatar algumas histórias.
Posted by Picasa